Hoje é dia da mulher
A Mulher Na Festa
Vou abordar o tema “A mulher e a
FESTA”, no toureio apeado, no toureio a cavalo, no apoderamento e na critica, onde
nem sempre tiveram a vida facilitada bem pelo contrário.
Mas, como já alguém escreveu “O toiro jamais pediu o “bilhete de identidade”; jamais quis saber se pela frente tem uma mulher ou um homem; o
que sempre pediu foi valor, mais valor e muito valor… e depois técnica.
Começo pelo toureio apeado.
Entre os primeiros nomes
femininos que apareceram no mundo do toiro há a destacar três:
No último quarto do
século XVIII, uma mulher atreveu-se a rivalizar, com os nomes mais sonantes da
época. Nicolasa Escamilla, “La Pajuelera”, chamou à atenção pelo seu invulgar valor.
Goya viu-a tourear em
Zaragoza, onde lidou um toiro, e
imortalizou-a nas suas pinturas dedicadas à tauromaquia.
O caso mais célebre e
insólito, foi protagonizado por Maria Salomé, “La Reverte”. Dizem que foi valente, hábil com as bandarilhas, e eficaz com
o estoque, e que a partir de 1908 assegurou que era um homem – de nome Agustín Rodríguez – para “burlar a proibição do toureio para as mulheres”, e continuar nas arenas.
“La Reverte” apresentou-se na praça
de toiros do Campo Pequeno na temporada de 1902 toureando ainda em Algés e na
Figueira, e segundo as prosas de então, agradou pela decisão e elegância como
bandarilhou, e pelo bom estilo com o capote e muleta.
Com estas mudanças de
sexo sem cirurgia, La Reverte não escapou á humilhação, de lhe chamarem
Hemafrodita.
Um outro episódio
singular foi passado com Juanita Cruz, também muito marginalizada pela lei.
A sua primeira actuação
aconteceu em Cabra (Córboba) no ano de 1933, fazendo o paseíllo ao lado de
Ramón Lacruz e de um então desconhecido Manuel Rodríguez “Manolete” como sobresaliente,
numa tarde em que cortou os rabos dos seus dois novilhos, e que lhe valeu somar
33 novilhadas nessa temporada.
Juanita Cruz debutou em
Madrid a 2 de Abril de 1936, com novilhos da viúva de Garcia Áleas.
Após a Guerra Civil foi
viver para a Venezuela, e mais tarde converteu-se, na primeira mulher a receber
a Alternativa, a 17 de Março de 1940 em Fresnedilla (México), tendo como padrinho
Heriberto García com toiros de Cerro Viejo
Ao longo da sua carreira participou em cerca
de 700 festejos, dos quais 460 foram na América, e nunca vestiu taleguilla,
usando vestidos de tourear com “saia – calça” bordada.
Juanita Cruz
apresentou-se ao público português, no Campo Pequeno, a 11 de Junho de 1933.
Como dado curioso
regista-se o texto inscrito na lápide do seu mausoléu, do cemitério de La
Almudena, em Madrid (uma escultura de tamanho natural, em que a toureira,
aparece a brindar) e onde se lê: “A pesar del daño, que mi hicieron en mi pátria, los responsables
de la mediocridad del toreo de 1940 a 1950… Brindo por España!”.
Mais recentemente
lembro-me de Mari Cruz que vi tourear em Queluz nos anos setenta, que veio
depois a ter uma relação amorosa com o bandarilheiro e atleta celebre de luta
livre António Augusto “El Indio Apache” de quem teve um filho. Este
Ant Augusto foi cabeça de cartaz, nos Espectáculos tipo recortadores
organizados pelo Sr. Alfredo Ovelha.
Mari Cruz era uma toureira de
sentimento e com certeza uma pessoa excelente, que alicerçou uma sólida amizade
com a sr. dª Isabel Palha R. Telles, que eu testemunhei de uma vez que fui com mestre
David e os filhos a França ver um cavalo, enquanto a srª de Ribeiro Telles ficou
em Madrid com Mari Cruz para irem no domingo a uma Feira tipo Feira da Ladra, o
que fazia com uma certa assiduidade, como me apercebi no decorrer da viagem.
Em
Portugal
distinguiu-se Ana Maria d’Azambuja, que conheci bem nos seis anos que trabalhei
na casa Ortigão Costa e vivi em Azambuja. Ana Maria
chegou a ser apontada como a grande revelação do toureio a pé.
Foi a única mulher em Portugal a obter a
carteira profissional, mas a sua carreira durou apenas dois anos. Ana
d’Azambuja foi pressionada a abandonar um mundo onde havia apenas lugar para os
homens.
. A mágoa de uma curta carreira, que
durou pouco mais de dois anos, e que terminou depois de muitas pressões, de um
meio proibido a mulheres, ainda se sente no olhar de Ana Maria.
Disse-me um dia: “Conheço a Cristina
Sanches. Uma mulher matadora de toiros em Espanha que tinha todas as condições
para ser uma grande toureira. Ela desistiu há menos tempo que eu e pelas mesmas
razões. Para as mulheres o mundo dos toiros é um objectivo quase impossível”.
Ana Maria confessou-me que, ainda hoje
não percebe a relutância de alguns homens do meio, em aceitar uma mulher na
arena.
Se hoje ainda há alguns entraves na
entrada das mulheres no Mundillo, há quatro décadas a situação era muito mais
dramática. “O mundo dos toiros é complexo e difícil, mesmo para os homens,
ainda mais para as mulheres!”.
Em 1968, altura em que Ana Maria
entrou na actividade do toureio, empresários e toureiros preparavam autênticas
armadilhas às mulheres que se aventuravam na arte. Os Matadores, recusavam-se a
participar nas mesmas corridas, e chegavam ao ponto de armar ciladas, lançando
na arena toiros já mexidos (já lidados), e colocando em perigo a vida de quem
toureava. “E se a mulher mostrava que tinha valor era ainda mais difícil”,
garantiu-me.
Ana Maria acredita que a forma como o
público a acarinhava, incomodava os seus pares, que
sentiam o prestígio roubado por uma mulher.
Apesar dos entraves que já pressentia
ao longo do seu percurso entregou-se de corpo e alma à arte.
Foi o meu amigo António Salema, seu
professor e apoderado, que acreditou nela
incondicionalmente . Ensinou-a, e conduziu-a até ao limite possível da
sua carreira. Na última corrida no Montijo, momento em que o mestre… a
aconselhou a abandonar o toureio, Ana Maria foi colhida e quase perdeu a vida,
depois de ter sido vítima de uma troca propositada de toiros. António Salema,
um apaixonado pela festa brava, para quem o talento se sobrepõe ao sexo,
lamenta a época em que Ana Maria apareceu nas lides, e disse-me uma vez ao serão,
na já desaparecida tasca azambujense que curiosamente se chamava , Leitaria
ideal, repito, Salema disse-me um dia: “Teve o azar grande de ser mulher, e de
aparecer no mundo dos toiros em 1968”.
Dos exemplos mais recentes o destaque
maior vai para Cristina Sanches.
No toureio a cavalo a história é
substancialmente mais rica.
Em Portugal começa com Maria Mil
Homens, que diz quem a conheceu, que com o capote e a muleta em tentadero
demonstrava igualmente jeito e valor.
Com vossa licença vou ler um extracto
de uma um trabalho meio entrevista, que foi feito por Mário Gonçalves para um
jornal Ribatejano. Escreveu o autor:
Maria Mil
Homens Chaparro, uma antiga cavaleira tauromáquica de Samora Correia, foi criada
pelos avós no meio do campo, onde sempre teve contacto com os cavalos. Maria
Mil Homens cedo percebeu o gosto que tinha pelo toureio a cavalo. Com 10 anos
de idade já montava a cavalo. Era este o meio de transporte que utilizava
quando tinha de ir fazer alguns recados aos avós. Conta que para conseguir
subir para o cavalo precisava, muitas vezes, de se apoiar num banco de madeira.
Mas tudo
terá começado, verdadeiramente, aos 15 anos de idade. Um dia, foi convidada
para ir assistir a uma brincadeira com touros numa pequena arena existente na
Herdade da Baracha (onde decorreu a Quinta das Celebridades).
Mal chegou
ao local, foi logo convidada para ir tentar, tourear um pequeno garraio.
Inicialmente,
diz que hesitou, até porque não tinha cavalo, nem roupa adequada. Rapidamente,
lhe emprestaram um cavalo, uns sapatos e umas esporas. “Foi o primeiro ferro
que espetei na minha vida”.
O sucesso
do momento parece ter sido tão grande que o nome de Maria Mil Homens
rapidamente se espalhou pelo meio taurino português. A cavaleira foi quase
sempre uma auto-didacta. O facto de não ter dinheiro para pagar a quem lhe
pudesse ensinar, levou-a a aprender quase sempre sozinha. A aprendizagem foi
tão rápida que os convites para actuar, começaram a surgir de imediato.
Participou em muitas dezenas de corridas nas principais praças portuguesas.
“Lidei touros do Minho ao Algarve, sempre com praças cheias de gente”.
Maria Mil
Homens chegou a actuar muitas vezes “de borla”. Era convidada a participar em
corridas de beneficências para algumas instituições mais carenciadas do país.
Sempre que a convidavam, respondia com agrado. “As pessoas não devem só pensar
em ganhar dinheiro. É importante ajudar quem precisa”, defendeu.
. Os avós
que a educaram dedicavam-se muito ao trabalho de campo, e não tinham muito
tempo para acompanhar a neta. Diz recordar-se como se fosse hoje que “chegava
na altura a ganhar dois mil escudos por corrida”. “Era muito dinheiro”. E só
assim conseguiu comprar dois cavalos.
Apesar de
todo o sucesso alcançado, esta samorense de gema, nunca fez do toureio a sua
profissão exclusiva. Na altura em que não actuava, trabalhava no campo ao lado
dos seus avós.
O grande
momento da sua curta carreira, aconteceu em 1951. Nesse ano, foi convidada a
participar em várias corridas de touros, que se realizaram em Angola. A sua
actuação foi tão brilhante, que só conseguiu deixar o continente africano, ao
fim de cinco longos meses de corridas. Conta que as suas grandes actuações
foram em Benguela e Lobito.
Mas, na
altura em que estava no apogeu da sua carreira prometedora, Maria Mil Homens
acabou por desistir. “Aos 23 anos apareceu o casamento, e como o meu marido não
via com bons olhos este meu sonho, acabei por desistir”. Diz que se fosse hoje,
teria continuado. Mas, na altura, as raparigas não podiam sair de casa como
acontece hoje. Logo depois do casamento, surgiram os filhos. “Foi o fim da
minha carreira”, adiantou.
Logo
depois de Maria ou mesmo em simultâneo surgem, Maria Da Graça, Nazaré Felicio e
a seguir, Elisa Raposo, Dália Cunha ( destacada atleta do Sporting) e Gina Maria.
Por fim aparece Conchita Citron, de todas a que mais se destacou no mundo, e
que acabou por ser considerada Portuguesa por adopção.
Nos
últimos Vinte anos Surgem: Marta Manuela, Mónica Monteiro (história do desastre
– Hoje cavaleira dressage Paraolimpica) Ana Batista, Sónia Matias e mais
recentemente Joana Andrade, Ana Rita, Isabel Ramos, As irmãs Sofia e Cláudia
Almeida, Mara Pimenta, Maria Mira e mais uma ou duas que despontaram.
Há cerca
de 20 anos toureou e bem, meia dúzia de corridas Rola Palha mulher do Dr. Filipe
graciosa e Filha do falecido ganadero Sr. Fernando Palha.
Em
Espanha, a primeira rejoneadora a ter uma certa notoriedade foi Amina Assis, a
quem o cavaleiro Manuel André Jorge vendeu toda a sua quadra de cavalos após
ter toureado uma corrida com ela.
Na época
dos quartetos, surge um quarteto feminino interessante, que várias vezes tive o
prazer de ver tourear, contituido por:
Antonita linares, Emy Zambrano que chegou a tourear em Santarém, Lolita Muñoz e Paquita Rocamora
Mais
tarde surge outro quarteto por ideia minha, proposta ao grande taurino Paco
Dorado. Dirigi o quarteto enquanto este existiu, e minhas senhoras… não foi
nada fácil.
Quarteto
Marie Sara, que Fracturou um pé, e
acabou substituída por Patricia Pellen, depois de se experimentar uma corrida
com Vitória Santana, com pouco geito, e outra corrida com Julie Cavaliere, óptima cavaleira, boa toureira
mas que em termos de conexão com o público, representava a alegria dos
cemitérios .
Acabou o quarteto com Patricia Pellen, Raquel Orosco, Natalie, Ana Batista
E foi assim constituido, que foi
apresentado na Figueira da Foz numa televisionada e no Campo Pequeno.
Conheci ainda na mesma altura, Camuci
que era aciganada e valentíssima, mas por ser pobre não vingou.
Surge por fim Noélia Mota com valor, e de que já certamente ouviram falar.
Vamos agora falar de França.
Curiosamente, a primeira figura a
fazer despertar os franceses para o toureio a cavalo foi uma mulher de nome
Maria Gentis, nascida em 1870.
Maria, iniciada na nobre arte da
equitação circense na academia de Paris, desperta para o toureio quando assiste
às corridas à portuguesa, que se realizaram nesta cidade em 1889, nelas
participando José Bento Araújo e Alfredo Tinoco, vindo este último a ser seu
mestre e dizem que namorado…
Apresenta-se em público nesta mesma cidade, no
dia 24 de Maio de 1891, com o nome artístico de L’Amazone Fin de Siécle.
Dpois de tourear por toda a França, matando os toiros, retirou-se em 1896, na sequência de uma
brutal campanha machista na imprensa, que influenciou
o público até ao ponto de nada lhe
perdoarem, convidando-a a regressar às origens, a ir para o circo, e chegou-se
mesmo ao cúmulo de grupos organizados de machistas levarem panelas para a praça, enquanto
gritavam slogans do tipo: “à la
cuisine” “á la cuisine” .Uns anos depois da retirada
tempestuosa de Maria Gentis, surgem duas figuras que voltam a entusiasmar os
aficionados: Albert Lescot e, principalmente, essa mulher notável, que o tempo
veio envolver de misticismo, Emma Callais.
Falemos então de Emma Callais, toda ela
uma história recheada de paixão, aventura, arte, vivência atribulada,
êxitos e drama, muito drama, tudo isto mais tarde passado ao teatro numa peça dramática.
Nascida em 21 de Dezembro de 1907, assiste pela primeira vez, com 15
anos , a uma corrida em que participava Albert Lescot que era
figura á época.
A partir desse momento, vive a obsessão de
tourear a cavalo. mas a família não a apoia e só mais tarde, quando casa, em 24
de Agosto de 1930, com o seu mestre de equitação, Joseph Callais ( de onde lhe
vem o apelido), consegue realizar o seu sonho, tendo-se apresentado em público
em Raphéle no dia 15 de Agosto de 1931.
Toureia
então por todo o país , muitas vezes com Lescot, e, em 1934, abrem-se-lhe as
portas de Espanha, tendo Barcelona, Saragoça, Salamanca, Valência e até Madrid
– para só falar das praças mais importantes - aplaudido a sua arte e ousadia.
Três anos mais tarde, a França está em
guerra, o marido é mobilizado e todos os seus cavalos são requisitados , com
excepção do célebre ( Sultan- ferro Pébre ).
Depois desta fase agitada, Emma
Callais reapareceu em 1942.
Durante os anos da guerra dedicou-se a
preservar a selecção das ganadarias da região, cujos homens da casa tinham sido
mobilizados.
Em 7 de Agosto de 1944, quando
regressava de uma corrida de automóvel com a quadrilha, a caminho de Arles, o
carro foi metralhado por um avião, que ainda hoje não se sabe se era alemão ou
dos aliados, morrendo todos os ocupantes.
Que triste sina a desta mulher…
Surgem nos anos oitenta Corine bernard (valentíssima), Marie Sara,
Helena Gayral, Lória Manuel (gisellene Vautraut) estas duas apoderadas por mim
e que viveram em minha casa.
Se fosse possível juntar a Coragem e
decisão da Lória, com a intuição, toureria e arte da Helena, fazia a melhor
cavaleira de sempre.
Surgem também Julie Cavaliere de que
já falei e ainda Marie Pierre Calé.
Quanto á equitação toureira, quero
destacar A mulher de Alvaro Domecq e de
Fermin Pai, a minha querida amiga Mercedes Ibarra.
Como empresária quero realçar Madame Poly, Francesa que bem conheci com o meu amigo José Zuquete, e que foi vários anos empresária de ARLES.
Como empresária quero realçar Madame Poly, Francesa que bem conheci com o meu amigo José Zuquete, e que foi vários anos empresária de ARLES.
Na critica foi figura Marivi Romero
directora dos programas taurinos da TVE, a quem os machistas fizeram a vida
negra.
No apoderamento e empresariado estamos
na presença do trabalho de Marie Sara.
Por fim, como Aficionadas entendidas. recordo principalmente as Srªs Dªs Maria Amélia Infante da Camara, Maria Manuel Cid, Tareca Ramalho, Mercedes Ibarra domecq, Mirna giron Ricard.
As mulheres têm a sua história na FESTA...