Crónica de Manuel Lamas de Mendonça
Á frente do burladero e ao lado do bom senso
W.
Churchill reconhecia que, a partir de uma certa idade, não é preciso
fugir ás tentações porque… as tentações fogem de nós.Parece evidente que
a gentinha anónima que se acotovela atrás do burladero ainda não chegou
a essa idade de sabedoriaSe bem me lembro existia uma diferença ligeira
entre estar atrás do burladero. E sair para a frente do mesmo.Uma
diferença em tudo semelhante entre o sair a terreiro para apontar
frontalmente faltas de bom senso, ou ideias de gosto duvidoso, e
permanecer agachado atrás de tábuas, a miar umas coisas politica e
moralmente correctas, mas tão insonsas como a pasta de queijo da
vaquinha sorridente. Por acaso não achei que as exposições de
Presépios, pais natais e Meninos Jesus do Sortesdegaiola tivesse
correspondido a um momento de particular inspiração, ou sequer de fino
humor.Nem mesmo de elegância, para não falar já do respeito por coisas
que me são caras. Mas tenho presente que os Cortesões, teimam em
permanecer uma velha dinastia de jacobinos monárquicos e anticlericais,
tendo, como toda a gente compreenderá, alguma dificuldade em conciliar
todas estas facetas de uma rica e secular tradição de militâncias
antagónicas.Que seriam conflituais para qualquer arrivista de primeira
geração, acabado de calçar as botinhas catitas do alpinismo social.Essa
gentinha recém-chegada tem que aparecer alinhada, certinha, virtuosa e
subserviente para com aquilo que julga ser o ar dos tempos. È a condição
de todos os cristãos novos e recém-chegados . Têm de exagerar na
virtude. Ser mais papistas do que o papa. Há séculos que existem regras
para a assimilação de cristãos-novos. E, bem observadas por gente com
saber fazer , e saber estar, essas regras tem funcionado
satisfatoriamente no tempo longo. Mas vinca-se em alguns de nós uma
tendência irreprimível e popularucha para que um reparo bem apontado, e
cheiinho de razão, descambe, e tanto, que acaba por esquecer o alvo e
perder a razão. Foi o que aconteceu com a rapaziada acoitada atrás do
burladero que não gostou das exposições de Presépios, pais natais e
Meninos Jesus do Sortesdegaiola. Eu também não gostei. Nem sou obrigado
a reconhecer em José Vilhena um continuador do Bordallo ou do Stuart
Carvalhais. Ou a acreditar que chalaça é um sinónimo de senso de humor.
E posso mesmo entender que, nesta mudança de paradigmas universais, é
mais ajuizado que os cristãos, ou simples cristianizantes, exijam -
com a coragem da lucidez - o mesmo respeitinho pela suas crenças
fundacionais que nos é imposto pelo Islão ou pelo Sionismo.Mas o que me
irrita supinamente é que se perca a razão, como sucede com a gentinha
que se alapa atrás do burladero. Porque não resiste a confundir logo
alhos com bugalhos. Porque escorrega logo para à perfidiazinha mole.
Porque tropeça na delação de sacristia e num indisfarçado oportunismo de
rivalidade clubista. Seria tentado a concordar com a gentinha atrás do
burladero. Se fossem a voz mítica do povo truculento e vociferador.Um
povo indignado, que lava no rio as ofensas àquilo em que acredita, e dá a
cara.Ou tem um nome que assina. Mas sacudo de mim a eterna rata de
sacristia burguesa que só dá esmolas e à saída da missa. Ou os bons
conselhos piedosos que apenas dão jeito a quem pretende entalar o
vizinho e gamar uma courela à Misericórdia.Ficamos entendidos.
Criado de Vocelências Manuel Lamas de Mendonça
Criado de Vocelências Manuel Lamas de Mendonça