É meu hábito frequentar verdadeiras tascas de quando em quando, nas praias de pescadores de Buarcos, Tocha, Mira e Costa de Lavos, onde tenho amigos, para sentir o pulsar dessa gente mítica que expõem ou expuseram a vida no mar. Quando falo de tascas, falo daquelas poucas que ainda há, onde de manhã se bebem branquinhos, traçadinhos, e de inverno bagaço puro e duro. Ã tarde é mais tinto prós mais velhos e minis prós mais novos, que podem ter como acompanhamento escabeche frio de carapau (alho picado, azeite cru e vinagre) ou sardinha de escabeche quente ( Cebola frita em azeite, folhas de louro, muito vinagre e uns poucos de grãos de noz moscada). ou ainda uns queijinhos secos.
As conversas que ali se espalham têm estes três tipos de interlocutores : os velhos que já há muito não vão ao mar, os recém reformados das fainas que ainda não interiorizaram bem que o seu tempo acabou, e os contemporâneos no activo.
Os mais novos falam naturalmente das suas façanhas, ás vezes de forma empolada pela vaidade própria da idade.
Os recém reformados são geralmente avinagrados, ou porque as esposas lhes avinagram a vida, ou porque as amantes lhes exigem o que eles já não podem dar, mas principalmente por se sentirem ultrapassados numa vida em que tiveram glória que nunca imaginaram ser efémera. Dizem que o mal é haver pescadores a mais e uns mais cagados que outros, e recordam os do seu tempo sem terem consciência de que o seu tempo ainda não é história, numa petulância em que todos presumem terem sidos grandes lobos do mar.
Os mais velhos que viveram os sacrifícios como por exemplo os riscos brutais nos "Dóris bacalhoeiros", sem segurança e completamente expostos ás tormentas, também contam as suas façanhas, mas de voz pausada, regozijam-se por haver mais homens na faina, com todo o respeito pelas tripulações de todos os barcos actuais ( Campanhas) e sem quererem ser mais do que foram, e rematam de quando em quando, inspirando - me todo a admiração, com esta frase : "No meu tempo é que o mar era.." ao que invariavelmente respondo com um sorriso complacente de um respeito quase veneração, para quem é parte integrante da "HISTÓRIA".
Depois do que escrevi, convido os leitores a fazerem o paralelismo entre o que se passa no mundo dos pescadores e no mundo dos toureiros, forcados, apoderados e empresários tauromáquicos, e depois tirem as vossas conclusões...