MANIFESTO DA DIRECÇÃO: Este blogue “www.sortesdegaiola.blogspot.com”, tem como objectivo primordial só noticiar, criticar ou elogiar, as situações que mais se distingam em corridas, ou os factos verdadeiramente importantes que digam respeito ao mundo dos toiros e do toureio, dos cavalos e da equitação, com total e absoluta liberdade de imprensa dos nossos amigos cronistas colaboradores.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Com a devida vénia trancrevemos do "Face..."A temporada de João Moura Caetano, 
contada com a sensibilidade e belissima escrita de Leonor Barradas


A estória de uma temporada!

Por estes dias já se fazem contas, somam-se corridas, somam-se as expectativas e as promessas para a próxima temporada. Os dias que passam já são mais frios e mais pequenos, a cigarra já não canta de noite e as horas mudam incumbindo ao tempo o dever de se prolongar na escuridão dos serões passados a contar estórias.
Na alegria farta das memórias passadas surgem momentos, sorrisos, olhares e palavras que se contam e recontam, tal como as imagens que se olham vezes sem conta acompanhadas de uma legenda qualquer a que se acrescenta sempre alguma coisa que não se disse desde a última vez em que o gesto foi o mesmo.
É nas palavras que se escreveram que perduram muitos desses momentos, nas palavras que escrevi, que outros escreveram e que outros tantos sentiram e acompanharam.
Não sendo esta a ultima das crónicas, espero eu e todos os que carinhosamente se manifestam cada vez que a palavra saí, estas são certamente as últimas linhas desta temporada em jeito de balanço, que vai para além dos números e que fica pelos lugares e pelas pessoas. Os prémios chegam a quem os merece. As palavras também.
Ao longo destes dias e destas quarenta corridas chegamos até vós pela voz de uma só pessoa, essa pessoa sou eu, que apesar de não usar a minha voz senão no silêncio em que escrevo, fui o fio condutor entre o público e um cavaleiro. Pela minha mão passaram por escrito as emoções que tantos queriam ter dito e não tiveram oportunidade. Fui responsável pelos sentimentos de tanta gente e muitas vezes também do meu próprio sentimento.
Escrevemos até hoje e sempre sobre a mesma pessoa, sobre o mesmo cavaleiro: João Moura Caetano. A figura do momento, o triunfador da temporada.
Começamos neste caminho a 7 de Abril em Jerez de los Caballeros, passaram seis meses e o tempo prega-nos mais uma vez a partida de sentirmos que simplesmente não passou. Naqueles dias as expectativas eram grandes. Naqueles dias achávamos todos que esta poderia ser “a temporada”, mas ninguém ousou dize-lo. Os sonhos são como as cartas de amor…ridículos, já escrevia o poeta.
Por aqueles dias de Abril, onde a clareza das tardes já permitia que os treinos fossem mais intensos, chegou até nós a surpresa da temporada, chegou ao olhar do João o temperamento de um cavalo que é hoje aquele que toda a gente fala. Foi num dia de feriado em terras de Monforte, e no silêncio de uma vila quase deserta e na praça de toiros, que meses mais tarde serviu de palco para o grande acontecimento da temporada, que chegou o Temperamento. Era uma segunda-feira 16 de Abril. Um dia que marcou a história de uma quadra e de tantos triunfos de um cavaleiro. O cavalo estrela brilhou pela primeira vez nas mãos do João que lhe encontrou no seu instinto a verdadeira luz que faria dele, mais tarde, um cavalo de emoções.
O destino do Temperamento foi desenhado naquele dia. Um cavalo de grande porte e que em praça nos arrasou o coração vezes e vezes sem conta. O cavalo das fitas vermelhas e brancas. O cavalo que marcou a temporada. O seu “encantador” foi o comandante das batalhas e conseguiu dar-lhe a luz que a natureza já lhe tinha dado.
Nada mais foi igual a partir desse dia e até hoje!
Os triunfos do início da temporada sucederam-se como uma constante, entre a Chamusca, a Tolosa, Azambuja, Madrid…ai Madrid! Naquela tarde em que o temple desceu à arena e como um bailado da Zarzuela, cobriu de cores a praça dos sonhos.
No encantamento das expectativas e no receio das recordações, a alma do amigo elevou-se nas finas areias de Las Ventas. O solo protegido protegeu o cavaleiro e João Moura Caetano foi a figura da tarde, com ou sem prémios, pouco importa agora. Ficou a classe de um toureio diferente, e nesta altura já se falava e escrevia “ de um toureio de verdade”.
Naquela tarde em Madrid, o João fez a pazes com o passado e superou as imagens do infortúnio que outrora ali colhera. Superou-se e com o Xispa e o Temperamento provou ao seu amigo que apesar de não ser substituível, o seu lugar está agora bem ocupado e devidamente respeitado. Não se esquece Madrid. Mas também já não se lembra com mágoa, apenas com saudade!
Depois aconteceu Badajoz e outra tarde memorável para a temporada. O menino João cresceu e se fez cavaleiro a sonhar com o dia em que estaria do outro lado da arena, a acenar para o público que o aplaudia, quando desfilava rodeado de flores os triunfos ali conseguidos. Naquele tempo de sonhos e desejos encostava as suas crenças aos ombros dos pais e do avô Moura que carinhosamente o acompanhava à feira de Junho em Badajoz. De pequeno a grande. De menino a homem. Do sonho à realidade!
Esta temporada o João deixou na arena daquela cidade os sonhos do menino da vila. Mais uma vez a memória dos dias do passado reviveram-se nos aplausos de um presente. Ficou ali escrito naquela tarde de Junho mais um episódio da vida do João enquanto cavaleiro e principalmente enquanto ser humano.
O mês de Junho foi para mim e para muitos o mês da temporada, o mês em que mudaria tudo. Depois de Madrid e Badajoz aconteceu Alcácer do Sal e o público e a crítica taurina renderam-se à evidência. João Moura Caetano afirmara-se como grande figura da tauromaquia. Aquela tarde em Alcácer mudaria tudo. E mudou. A partir dessa altura houve uma consciencialização maior do toureio que o João praticava em praça.
Os ferros de frente e com verdade, de praça a praça e com a serenidade fria de quem está na arena com o intuito de arriscar, pisando terrenos de compromisso, demonstrando uma calma que quase convence, não soubéssemos nós que o coração salta no momento do ferro.
Acredito e penso que o escrevi algures numa crónica que o coração do João era de leão, embora saiba que é mais de dragão! Mas seja qual for é rijo e aguenta os ferros do Temperamento, ninguém sabe como aquele cavalo sai da cara do toiro de forma tão “limpa” e serena. Parece demasiado fácil para a tamanha complexidade.
Os triunfos foram uma certeza em cada praça que o cavaleiro pisava, entre Évora, Póvoa do Varzim, Moura, Foz do Sizandro, Terrugem, Albufeira, Beja e Lisboa.
E foi no Campo Pequeno que se fez história de novo numa noite de Agosto. A noite em que o Pai entregou ao filho a confiança de uma carreira e um amor eterno que não se esgota na vida real. A entrega de um testemunho de amor e de confiança. Estava na hora de entregar o “seu a seu dono” depois do instinto provar que as asas do João já eram grandes o suficiente para voar e no caso de cair se manter intacto, sem mais mazelas a não ser as da alma, porque essas ninguém as evita. Em Lisboa ficaram dois triunfos, o do toureio e o da família.
Depois seguiu-se Montemor-o-Novo e uma tarde de puro toureio, um daqueles triunfos inesquecíveis para qualquer cavaleiro. Um público rendido à evidência de um grande triunfador.
Anunciou-se mais tarde a corrida da temporada, Monforte 9 de Setembro. A crónica que escrevi dizia que o vento entrou de rompante naquela arena, bordando o toureio nobre e a concretização de mais um sonho. Muito se especulou sobre a iniciativa de tourear sozinho uma corrida na sua terra. João Moura Caetano travava assim mais um compromisso com o futuro baseado num sonho do passado.
Foi uma tarde de emoções a que vivemos em Monforte neste Setembro que passou, tanta gente na arena a brindar ao cavaleiro e ao amigo. Palmas, sorrisos, flores e a certeza que valeu a pena. Foi para além do sonho que se tornou real.
Por incumbência do divino ou não assistimos na arena de Monforte a uma das mais artísticas corridas de toiros da temporada e certamente da carreira do cavaleiro. O João reencontrou-se com as gentes da sua terra e encantou todos os que o admiravam e mais ainda os que o duvidavam. Um Senhor. Uma figura. Uma quadra de cavalos e o apoio verdadeiro de quem realmente conta, nas contas do coração!
Os paços largos caminhamos para o fim da temporada. Seguiram-se mais algumas corridas e mais triunfos. O descanso do guerreiro aconteceu há semanas na arena do Coliseu de Elvas.
João Moura Caetano levou ao limite da entrega o suspiro do último ferro, dedicando a lide aos que o acompanharam e a todos que em presença e ausência tanto lhe deram na arena e fora dela a certeza de que valia a pena. Tanta gente em pé aplaudiu aquele que no inicio desta crónica seria a promessa da temporada anterior e que no fim da mesma é já o triunfador.
Foram quarenta corridas e tantos triunfos, tardes e noites memoráveis, nas praças que já referi e em outras tantas como a Nazaré, Cuba, Messejana, Aldeia da Venda, Nave de Haver, Aljustrel, Garvão, Santa Amália, Carrascalejo, Valencia de Alcântara, Arruda dos Vinhos, Puebla de Alcocer, Arroyo de la Luz.
Setenta e dois toiros lidados, trinta e duas orelhas e dois rabos cortados depois de treze corridas em Espanha e Vinte e sete corridas em Portugal. Seis meses, muitos hotéis, muitos quilómetros, muitas flores, tanta gente, inúmeros artigos escritos, dezenas de registos fotográficos e estórias infinitas para contar.

Estórias como as minhas que são as vossas e que são as dele!

João Moura Caetano. O toureiro de quem se fala e o homem que eu descrevo.

No final desta crónica e desta temporada asseguro que fui a voz de tanta gente que não pode chegar a ele com a mesma facilidade que eu, ou se chegou, talvez não conseguisse dizer por palavras as emoções que o seu toureio transmite. Eu consegui porque ousei usar letras e construir frases, tornando mais fácil este monólogo de tanta gente para apenas uma pessoa. Os diálogos entre mim e o João foram estabelecidos pelas linhas destas crónicas corridas após corrida.

Escrevo e digo sempre o mesmo, eu sou o público, sou a voz comum daqueles que não tem voz no mundo da tauromaquia, quanto muito, tem as palmas e o julgamento subjetivo. Mas é este público que cria a figura e que alimenta a força para manter a vontade de continuar.

Não estive na arena as vezes que provavelmente deveria ter estado, mas assim o quis e quero que assim continue. O meu mensageiro é a voz de um olhar no silêncio das conversas que temos. Sou os bastidores do público e da mensagem e isso basta para escrever sobre o que se vê, o que se fala e principalmente o que se sente.

Há tanta gente que olha tanto e não vê nada!

Bem João! A crónica já vai longa. Vamos descansar finalmente destes intensos meses de estórias e de alegrias que tu certamente terás mais para contar. Ficam as palavras dos amigos que são a tua quadrilha, dos amigos que te acompanham corrida a corrida, dos teus aficionados, da tua família, do público em geral que hoje te reconhece um enorme valor. Descansa agora que o tempo corre depressa e na volta trás um novo ano e uma nova temporada.

Obrigado por teres sido o protagonista mais real das estórias que tenho escrito. A personagem principal deste conto, a que tantos outros acrescentarão pontos cada vez que referirem o teu nome em prémios como grande triunfador da temporada.

Há sempre alguma coisa que fica por dizer, mas acredito que neste momento o dom da escrita é apenas teu e serás tu a escrever nas linhas do Outono, os acontecimentos que os meses frios trazem à vida que vives para além das corridas.

Essa vida bem mais serena e calma que tanto te ajuda nos momentos em que estás no centro da arena e és o centro das atenções de todos. Eu e o público deixamos-te agora na tua vida serena. Mais tarde queremos notícias. Por enquanto vamos viver as alegrias que se aproximam, tu no campo, na caça, com os amigos e com a família. Eu sem monólogos ou diálogos na espera de uma estrela que iluminará os meus dias e noites ao lado do nosso mensageiro!

O tempo passa tão depressa que em breve estaremos de volta! Eu, o teu público, a minha escrita e o teu toureio. Obrigado pela brilhante temporada e por provares a ti mesmo que chegaste onde chegaste porque descobriste o teu lugar. Demorou o tempo que tinha de demorar, a vida é mesmo assim!

Foste o grande triunfador da temporada. E acima de tudo o triunfador da tua própria vida.

Encontramo-nos depois nestas páginas ou noutras. Tu mais ansioso com o futuro e eu mais serena com o presente. A vida acontece assim.

Umas vezes escolhemos e outros somos escolhidos!

Parabéns João. Obrigado!

E até breve! Num tempo em que os dias serão maiores e em vez de castanhas comemos queijadas!

E tudo começa de novo!...