Para homenagear o insigne cavaleiro procuramos um artigo escrito sobre ele no Almanaque Plateia editado em 1966 para o ano de 1967 ( Director: Baptista Rosa. Editor: António Dias. Proprietários: Aguiar & Dias, Lda).
Mestre Baptista
A história de um amigo de burros e vacas pretas
"Este título é um primor!"
É alto, magro, corpo seco. Em cada olhar, porém, o seu poder de perscrutar, de descobrir, de fulminar, é instantâneo. Tem 26 anos plenos de vida - moldados nessa planície alentejana onde nasceu, cresceu e aprendeu a arte que o tornou famoso.
Nasceu a 15 de Junho de 1940 em S. Marcos de Campo, uma aldeia de Reguengos de Monsaraz, situada na margem esquerda da ribeira de Degebe e a pouca distância da margem direita do Guadiana. A sua população é de cerca de 3000 habitantes divididos por cerca de 1000 casas. O serviço de correio não falta, nem a escola primária, nem a sociedade recreativa com os seus bailes domingueiros. Existe ali uma fábrica de tijolos, outra de mobílias alentejanas, lagares de azeite. Nos campos de S. Marcos cultivam-se cereais, e a produção de vinho, cortiça, mel e cera é satisfatória. S. Marcos é por conseguinte, o que o povo chama "uma terra progressiva".
Ali cresceu José Mestre Baptista. Ao tempo S. Marcos não tinha escola primária e, para ir a Reguengos frequentar as aulas, deslocava-se todos os dias de burro, que os 10 Km que separam S. Marcos de reguengos não se podem fazer a pé…
Assim, José Mestre Baptista se habituou desde a mais tenra idade a montar o seu burrinho. Do burro passou aos cavalos, mas não sem fazer alarde das suas tropelias… Uma que deu que falar lá na terra: subir a escadaria do adro da Igreja de Reguengos montado no seu jerico…
Terminada a 4ª classe, os pais matricularam-no num colégio a fim de tirar o curso dos liceus. Logo no 1º ano começou a dar faltas sobre faltas. Sentia nas veias o apelo da vida ao ar livre, das planícies e ia para a brincadeira com os outros rapazes do povo, que não tinham pais ricos para os mandar estudar… Decepcionado com a falta de tendência do rapaz para os livros, o pai de José Mestre Baptista acabou por o meter na vida da lavoura, ao lado dos criados, trabalhando com eles, de sol a sol e aprendendo o quanto custa ganhar a vida com o suor do rosto.
Um dia dirigiu-se ao pai com um pedido na ponta da língua:
- Já tenho 13 anos e gostaria de ter umas vacas pretas, para imitar toiros. Quero lidá-las…
O pai anuiu ao pedido com uma entrega de 8 vacas bravas… A sua carreira ia dar os primeiros passos. Alugou-as, antes de mais nada, para uma corrida em Reguengos, sob a condição de ser ele a tourear a cavalo. O pai assistiu - e no final não cabia de contente pela audácia do filho que não dera para os estudos, mas era já um verdadeiro homem montado no seu cavalo…
Em 1958, com 18 anos apenas, José Mestre Baptista tomava alternativa no Campo Pequeno… mas ficava reprovado. Desgostoso, tentou de novo a sua sorte dois meses depois e conseguiu-a com D. Francisco de Mascarenhas na Moita do Ribatejo.
Presentemente, José Mestre Baptista conta no seu palmarés com centenas e centenas de corridas. Quando actua cobra cerca de 15 a 50 contos, conforme as praças. A sua vida é bastante movimentada. No entanto, tem como residência em Lisboa um apartamento reservado no Hotel Impala, numa zona de pouco barulho da cidade. As admiradoras não o largam. Pedem fotografias directamente para S. Marcos do Campo, para a Televisão, para a casa Valentim de Carvalho (onde gravou a sua estreia como cançonetista - o paso-doble "Cortesias"…) e ainda para o Sindicato dos Toureiros e Hotel Impala.
Boatos sobre as suas aventuras amorosas correm toda a cidade, as vilas… e S. Marcos do Campo. No entanto, José Mestre Baptista continua a ser o rapaz simples e despretensioso que vai a toda a parte sem qualquer intenção de dar nas vistas. Gosta muito de cinema - chegou a fazer contrato para interpretar a figura de José do Telhado em "O Bandoleiro" - e nas noites que passa em Lisboa raramente perde uma estreia ou um filme de relevo nos cartazes. Os prémios acumulam-se. Óscar de Imprensa de 1963 e 1964, recebê-lo-ia também de 1965 se a bela iniciativa da Casa da Imprensa não sofresse este ano interrupção…
O antigo menino que percorria 10 Km à ida e outros 10 à vinda para ir à escola de S. Marcos do Campo até Monsaraz, é ídolo a brilhar que não ficará decerto por aqui…
Em 1966, José Mestre Baptista perdeu o "Falcão", o seu cavalo número um, mas continua com uma equipa difícil de ser ultrapassada, composta por seis cavalos de raça: "Forcado", "Talismã", "Guião", "Passapé", "Zorba" e "Cupido"!