O C. Pequeno vai homenagear o Maestro Mário Coelho na 5ª feira, e nós prestamos hoje e aqui a nossa homenagem ao notável matador.
Mário Coelho:
Mário Coelho:
De
ti não precisava de me preocupar em escrever “ p’ra que a terra não esqueça”.
A
tua história é por demais conhecida e o livro da tua vida é por demais
completo, para que me seja difícil acrescentar o que quer que seja.
Há
no entanto um aspecto que penso não estar suficientemente esclarecido, e que me
levou sempre a ter por ti grande respeito, que se traduz numa estima enorme.
Tu
és e sempre foste o antivedeta, no que toca á prática corrente do servilismo da
maioria dos artistas, que procuram agradar a todos, nem que para isso tenham
que fazer tábua rasa duma parte da dignidade.
Para
ti o que é branco é branco e o que é preto é preto, e deslealdades não perdoas,
como não perdoas ingratidões e não pactuas com impostorices nem com exemplares
de “Faz de Conta”.
A
ética e o respeito acompanharam-te na vida de toureiro.
Tens
amizades que se perdem no tempo.
Serviste
com competência rara e lealdade, grandes figuras.
Foste
durante anos o melhor do mundo num país onde poucos se destacaram ao nível
mundial.
Chegaste
sempre a onde te propuseste chegar.
Viveste
a vida com a maior intensidade.
Retiraste-te
quando achaste chegado o momento, sem tergiversações.
Respeitaste
o público e o público respeitou-te.
Não
circunscreveste o teu mundo ao mundo do toiro.
Sempre
disseste o que pensavas sem dar importância ás consequências.
Tudo
isto que acabo de dizer, personifica um homem de carácter que normalmente é
catalogado no segmento amorfo da sociedade, como um tipo incómodo ou com mau
feitio.
“O
êxito nunca é uma dádiva, é sempre uma conquista”, disse O. S. Marden.
A
história da tua vida, desde as pessoas importantes com quem te relacionaste,
até á notável carreira artística, passando por experiencias únicas, tem todos os
condimentos para ser invejada, tanto mais, que tudo isto se constata sem te
pores em bicos de pés.
No
cinema, tiveste a tua cota parte, e as ligações românticas com que cruzaste
fizeram de ti uma figura mítica que sobrevoa figurinhas de papel, que no
essencial, o toureio, nunca passaram de figurantes medianos ou medíocres e que
por ser assim revelam recalques respectivos.
Não
é figura quem quer, ou por outra, cada figura tem a sua dimensão, e a tua foi
plena no mundo que escolheste.
A
ternura, o respeito e a gratidão que mostras ao falar dos teus pais, projectam-me
nos valores que, na minha opinião, mais aprecio nos homens.
A
simplicidade e clareza com que descreves os teus progenitores, leva-nos a
passear pelos desvelos de tua mãe e pela disciplina de teu pai, concluindo eu
em consequência, que hoje a degradação da instituição família é um facto por
carência dos pilares pai e mãe.
A
tua aficcion era e é quase obsessiva, lembro-me para ilustrar esta afirmação
que muitas vezes prolongavas demasiado as lides, com o intuito nítido de
sacares do toiro mais qualquer coisa, nem que isso tirasse algum brilho ás tuas
prestações.
Ao
saber do teu relacionamento com gente como Orson Welles, Hemingwai e Picasso
senti a curiosidade de saber desta gente o suficiente para compreender o que
cada um deles teria de comum contigo.
De Orson Welles lembro a obra por si realizada em que
retratou em "Citizen Kane" a vida e a decadência de um magnata da
comunicação norte-americana, baseado na história do milionário William Randolph Hearst. Esse filme foi um
marco na carreira do actor. Depois de terminado o trabalho, "Cidadão
Kane" o mesmo quase não saiu, fruto de problemas com Hearst. Com nove nomeações
para o Oscar, Apenas venceu, o de melhor
roteiro original. A sua coragem de realizar esta obra prima acabou resultando
no fechamento de algumas portas no futuro,
Há aqui um certo paralelismo com a tua personalidade
no que toca ao destemor de enfrentar poderosos, desde que consciente que a
razão te assiste, do mesmo modo que esta frase célebre da mesma personagem
“Mesmo quando havia pouca esperança,
sempre procurei dar o melhor de mim” lembra a forma como encaraste as
dificuldades da tua vida de toureiro.
De hemingwai recordo esta frase “- A moral é o que faz alguém sentir-se bem e o imoral é o que faz
alguém sentir-se ma”l. Quem te conhece sabe que te sentes bem contigo próprio,
independente de polémicas e imune a injustiças.
Por fim, Pablo Picass eternizado pela sua obra” Guernica” e muito,
muito mais, que vai das colagens á cerâmica passando pela escultura e pela
poesia.
Teres a ideia de aproveitar do Génio, um seu desenho num bilhete de uma
corrida que ele te deu e transpô-lo para um fato de tourear, foi uma homenagem
a quem disse um dia: ”Uma
ideia é um ponto de partida e nada mais. Logo que se começa a elaborá-la, é
transformada pelo pensamento.
Já vai longa esta carta, mas mesmo assim não passa de
um retalho da tua vida, e é na recta final que me lembro, a propósito do teu
passado, de uma parte de um poema de Picasso que reza assim:
Soneto ao Luar
E
lembra-te sempre que:
A
vida não é medida pelo numero de vezes que respiraste,
Mas
pelos momentos em que perdeste o fôlego:
De
tanto rir…
De
surpresa…
De
êxtase…
De
felicidade…
Com este meu retalho da tua vida, quero contribuir
para que do homem de carácter Mário Coelho, se quede mais este ínfimo
contributo “P’ra que a terra não esqueça”.