Carta de Luís Capoulas a Bernardo Patinhas
Chegou-nos á mão esta carta de Luís Capoulas que passamos a transcrever:
Meu Caro Bernardo Patinhas,
Digm. Cabo do Grupo de Forcados Amadores de Évora
Entretido como ando nos meus afazeres, só agora, depois da leitura da Carta Aberta do nosso amigo e meu contemporâneo Coronel José Henriques, me predispus a dirigir-te algumas palavras de solidariedade perante os últimos acontecimentos ocorridos no nosso Grupo de Évora, que penso que provocarão uma profunda tristeza na generalidade de quantos tiveram a honra de vestir a sua gloriosa jaqueta, tecida na generosidade e na dedicação de sucessivas gerações de forcados, desde que no já longínquo ano de 1963 teu pai tomou a iniciativa de fundar um Grupo de Forcados na nossa cidade de Évora.
Associo-me, assim, à perplexidade e preocupação que perpassa pela Carta Aberta.
Perplexidade porque, tal como o signatário, sempre entendi um Grupo de Forcados como um grupo de amigos, de que a lealdade, a entreajuda e a tolerância perante eventuais erros de cada um são o cimento aglutinador.
Denegar estes valores esvai de sentido a figura do forcado amador tal como é de tradição, retira-lhe a mística que fazem dele uma referência de valores morais, no mundo tauromáquico como na Sociedade, e que constitui um justificado orgulho nacional, com reconhecimento além-fronteiras e muito em particular no México.
Não cabia, pois, na minha imaginação que do interior de um Grupo de Forcados, seja dos actuais ou de antigos forcados, pudessem nascer movimentos para o decapitarem do seu Cabo legítimo, escolhido consensualmente pelos seus elementos há poucos anos e, permitas-me que te o diga, a quem reconheço qualidades de “aficion”, de conhecimento, de dedicação e de forcado perfeitamente à altura dos pergaminhos do nosso Grupo.
No meu conceito, entrar num grupo de forcados é aderir àquele corpo de valores na relação entre todos, a que acrescem a galhardia, a coragem, a generosidade, a compostura e a coesão dentro e fora da Praça.
Mas, quando se entrega a jaqueta não nos despojamos desses valores.
Ter sido forcado amador é transportar a responsabilidade de defender todos esses valores e de os procurar transmitir às novas gerações, entendendo o Grupo como uma grande família cuja identidade devemos procurar perpetuar.
De modo muito particular ter sido Cabo constitui um especial compromisso de promover a coesão e mesmo de, discretamente, apoiar o Cabo na superação de eventuais dificuldades dentro do Grupo.
É, portanto, com grande desapontamento que depreendo do texto da Carta Aberta que alguém com um passado proeminente no nosso Grupo possa porventura não comungar deste juízo, que creio generalizado.
Partilho também e por inteiro da preocupação expressa na Carta Aberta com o futuro do nosso Grupo, já que minar a sua matriz de valores é minar os seus alicerces.
O Forcado, como a tauromaquia em geral, apoia-se na Tradição e na tradição da forcadagem não cabem conspirações para substituição do Cabo, em violação do pressuposto essencial de “um grupo de forcados como um grupo de amigos”, em que, como referi, a lealdade, a entreajuda e a tolerância são pilares fundamentais.
Daí a minha preocupação com as repercussões futuras deste acto impensado na credibilidade do nosso Grupo e na sua imagem para o exterior.
Bernardo,
Já me alonguei demasiado, tendo em conta a modéstia do meu contributo para o prestígio da jaqueta de que tanto nos orgulhamos, mas não consegui exprimir em menos palavras a mágoa que sinto e a solidariedade que me mereces.
Uma palavra final para o teu pai, o nosso eterno Cabo fundador e “grande maestro” João Patinhas, e para a tua mãe, merecidamente credores do maior respeito e admiração por tudo quanto deram ao Grupo de Évora durante toda uma vida.
Eles são um exemplo raro de amor e de dedicação ao forcado amador, que os bons aficionados jamais esquecerão.
Que não se deixem abater por um tão justificado sentimento de ingratidão.
Um abraço amigo para ti e para teus pais,
Luís Capoulas
(12.10.2011)